Conversas que não voltam
Todos os dias passava na frente da escola que meus filhos estudaram no Infantil. Cresceram, já não a frequentavam, mas era o meu caminho. Vez ou outra tinha vontade de entrar, fazer uma visita à diretora. Gostava muito de conversar com ela. Mulher inteligente, lutadora, uma empresária à frente do seu tempo. Tinha como parâmetro a escola de Reggio Emília, cidade italiana, referência mundial em educação, para onde ia fazer intercâmbio todos os anos com outros professores. Sua observação sobre vida e educação ajudou milhares de crianças a caminhar com uma visão de mundo mais ampla. Muitos saíam de lá alfabetizados, antes mesmo do que chamamos de Primeiro Ano do Ensino Fundamental, um tremendo adianto em relação à Base Nacional Comum Curricular estabelecida pelo Ministério da Educação.
Tinha um estilo pedagógico único e lidava com conflitos que poucas vezes vi em alguém. Sabia equilibrar firmeza com afetividade e possuía um senso de justiça incomum. Ela ia além do ensino. Fazia questão de falar com os pais sobre questões que poderiam impactar o aprendizado, mas também a vida das crianças no futuro. Não foram poucos aqueles que, a partir dessas conversas, tomaram decisões importantes para recolocar o trem nos trilhos em casa.
A vida de um empresário da educação vai sempre além. Como aconteceu com boa parte deles, a pandemia trouxe muitos novos olhares e uma brutal necessidade de reequilibrar os negócios. De lá para cá passei muitas vezes por lá. Por duas ocasiões a encontrei na porta: “Venha tomar um café”. “Faz tempo que não conversamos”. E era fato. Ao longo da passagem dos meus pela escola, tivemos ótimas conversas, dentro do ritual de feedback da molecada ou fora dele, no informal.
Esta semana a notícia que jamais queríamos ouvir. A diretora não resistiu a uma cirurgia para eliminar um câncer recém-descoberto. Quem tanto disse, e quem tanto deu voz aos pais e alunos, silenciou. Aquela última conversa não vai mais acontecer. E isso acompanha um lembrete sobre a importância das conexões humanas que vamos construindo ao longo da vida. As conversas que não voltam testemunham o valor dos momentos compartilhados, das palavras trocadas e dos conselhos, mas acima de tudo nos alertam a não deixar para amanhã aquilo que podemos fazer hoje.
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