A cor da medalha é o de menos
Neste domingo, quando a prova do solo no Mundial de Ginástica Artística em Antuérpia encerrou a competição, pela primeira vez na história o Brasil emplacava recordes e duas ginastas no pódio: Rebeca Andrade era prata e Flavia Saraiva, o bronze. O que se viu momentos antes da entrega das medalhas chamou a atenção. Simone Biles, a supercampeã, reagia com uma certa frieza, contrastando com a festa do lado brasileiro. Biles, é bom que se diga, abandonou a maior parte das finais nas Olimpíadas de Tóquio para cuidar da saúde mental e na semana passada simplesmente surpreendeu o mundo executando um salto tão difícil que acabou sendo registrado com a maior pontuação no código da Federação Internacional de Ginástica.
No pódio, Biles sorriu para as fotos. Também curtiu a pista de dança mais tarde, mas quem acompanhou aqueles minutos pós resultado ficou sem entender muito bem. A menina de ouro estava séria; a menina de prata destilava graça e sorrisos, mas quem de verdade estava radiante era Flavia, que experimentava o gostinho pela primeira vez.
Esse recorte me faz pensar sobre como somos reféns de nossa mente. Não há crítica aqui, apenas uma observação. Biles já subiu ao pódio mais de 30 vezes em Mundiais e Jogos Olímpicos. É um assombro. Rebeca alcançou o feito 11 vezes. É um fenômeno, ainda mais se pensarmos nas condições que ela teve para desenvolver o seu talento. Encontrar a motivação depois que os resultados chegam não é tarefa fácil.
As diferentes reações de Biles, Rebeca e Flavia talvez não queiram dizer absolutamente nada, mas me fazem pensar sobre aquele estado de espírito que nos faz sentir maiores e mais fortes, que nos faz viver emoções únicas. É como se pedíssemos para um parisiense vibrar como um estrangeiro quando vê a Torre Eiffel pela primeira vez. Simplesmente não vai rolar. São distintos os níveis de descarga de dopamina, serotonina, endorfina e ocitocina.
Por isso deveríamos nos educar a desfrutar das coisas que gostamos e que nos tocam como se fossem inéditas. Viveríamos e contemplaríamos mais intensamente. Para Flavia Saraiva, a cor da medalha foi o que menos importou e isso nos ensina um bocado.
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